segunda-feira, 21 de junho de 2010

Cidade cinza


Cinza. Da cor da neblina, do sol quando se esconde por trás das nuvens, da poluição. Da cor da tristeza, do frio, do rijo concreto. Sim, da cor de São Paulo. Não tenho nada contra o cinza: ele é indiferente, medíocre. Tanto quanto a indiferença de gente que se evita, que se afasta, que se mata.

Cinza, da cor do metrô de uma cidade inóspita. Da cor da enxurrada que transborda o asfalto. Dos viadutos que engolem as ruas. Cinza, da cor da faca e da bala que correm soltas na sexta, no sábado, no domingo. Todo dia.

O cinza da fumaça do ônibus que atrasa e do trânsito que congestiona. Cinza das estradas, batizadas de avenidas, das pontes pelas quais nem se pode andar.

Cinza, da cor das grades, das pistas, dos fastigiosos muros que separam os vizinhos, os amigos. Todos apartados, tudo cindido. Cinza, como os quadriláteros restritos, onde a felicidade custa caro.

Cinza das ruas abandonadas, escuras, do boteco sujo, que às vezes é banhado por vermelho. Vermelho sangue. Vermelho, como a luz da sirene. E só, porque o resto é tudo cinza. Tudo espanta, amedronta. E às 19h todos fogem para suas casas, e se trancam, e olham o mundo de longe, por uma TV, às vezes branca, preta, e cinza.

Cinza, da cor das pichações desbotadas no topo dos prédios, dos monumentos. Pichações que agridem, que semeiam ódio. Cinza de mofo. Sentimentos mofados, porque para eles nem sempre há espaço. Nem tempo.

Cinza. Da cor do rio que corta a cidade. Da pobreza dos becos. Da cor do “pó” da indiferença, da solidão. Da cor do lixo.

Um comentário:

Raphael disse...

Karina, que lindo texto! Parabéns!

E essa cidade cinza, muitas vezes tão inóspita de sentimentos, acaba acinzentando ainda mais nossa massa cinzenta, e afugentando belos pensamentos.


Beijo!

Raphael Máximo