quinta-feira, 24 de junho de 2010

A insustentável satisfação do ser


A velha impressão de que vivemos a espera de alguma coisa, não se sabe o quê, de alguém, não se sabe quem. A vontade de chegar à algum lugar, quando não há nenhum lugar para ir. Porque pensamos que a vida não pode ser “apenas isso". É a sensação de incompletude, de que algo nos falta para ser feliz, alguma coisa que nos preencha. Mas o quê?

Quando temos um bom emprego, falta-nos o amor, se temos o amor, falta-nos o emprego. Se temos ambos, então nos faltam os filhos, cachorros, amigos. E quando parece que tudo está completo, a surpresa: o amor se desfaz, os filhos se vão, o trabalho torna-se exaustivo. E começa o desassossego. É preciso viajar, trabalhar mais, fazer um curso, mudar de emprego, de mulher, de marido. Ninguém sustenta a satisfação por muito tempo. Quando menos se espera, bate o vazio, a sensação de que tudo está errado. E começamos a incessante busca por aquilo que nem sabemos o que é.

Um amigo, há um tempo atrás, dizia estar infeliz. Motivo: estava desempregado. Dois meses depois começou a trabalhar, tendo um salário razoavelmente bom. Novamente sentiu-se insatisfeito, o que o levou a pedir demissão e partir para um novo emprego que, segundo ele, era perfeito. Mostrou-se uma pessoa feliz durante os dois primeiros meses, quando começou a reclamar a falta de um amor. E se ele encontrasse o amor, certamente ainda lhe faltaria algo, era só questão de tempo.

Gangchen Rinpoche, um curador tibetano, fala sobre este sentimento de incompletude: "Frequentemente, sentimos falta de algo quase imperceptível, algo que não é mental, intelectual. Até mesmo nas situações privilegiadas, em que pensamos estar satisfeitos, logo surge esse sentimento sutil de que algo nos falta. Temos, então, a prova de que a vida material não é suficiente, e saímos em busca de algo mais espiritual. Esse algo que nos falta é encontrar e tocar nosso próprio potencial de paz.”

A expectativa também é um problema. Muitas vezes penso que a insatisfação venha do desejo de esperar que algo externo possa tornar-nos felizes. Uma mudança de cidade, de religião, uma nova aquisição material, talvez um novo namorado(a). Esperamos que, ao realizar todas essas ilusões, nossa vida dê um giro de 360 graus. Engano, claro. Em curto prazo pode parecer que está tudo bem, mas logo, lá está ela: a insatisfação do ser. Falta calmaria ou falta agitação. Falta alguém ou falta solidão. Falta tudo ou sobra demais.

É possível que nossa insatisfação sirva de alavanca aos nossos objetivos, incentivando a busca por novas ideias, por uma vida melhor. Possível, apenas. E às vezes me desespero. Pergunto-me se um dia, afinal, estaremos realmente felizes, completos. Mas parece que não existe vida plena. Talvez, apenas no último suspiro, com a sensação de missão cumprida, de final feliz. Enquanto isso, procuro significados e respostas. Pois soluções, provavelmente eu nunca encontre.

Ah, e quanto ao título do texto, fiz alusão ao livro “A insustentável leveza do ser”, que aborda sobre a leveza e o peso. Excelente livro de Milan Kundera, romancista tcheco, autor de diversas obras memoráveis. Penso que nossa insatisfação seja o “peso” que carregamos junto à vida. De qualquer forma, em ambos os casos, o problema é a própria existência, o problema é "ser".

2 comentários:

Raphael disse...

Mais um belo texto!

Anônimo disse...

Sabe de onde acho que vem essa angústia de ter a felicidade logo ali na frente, mas não conseguir alcança-la?
Acho que é porque procuramos um sentido para a vida. A vida é vazia de sentido. Qual é o sentido de um mosquito? Qual é o sentido de uma pulga? Ou de uma estrela que, ao consumir seus gases, expande e apaga?
A vida é experiência. Acredito que estamos aqui para experimentar o que é viver. Provar o doce e o salgado das coisas, o bem e o mal. Não fosse isso, sentimentos e memórias não nos moviam tanto.

Obrigado pelo texto, abraço

Karam - www.inspirefundo.posterous.com